Revista SuperInteressante
Com massagens, plantas
medicinais, meditação, dieta balanceada, postura correta e contato com a
natureza, o ayurvedismo ganha milhões de adeptos em todo o mundo afirmando que
corpo, mente e espírito em equilíbrio são a melhor barreira contra doenças e estresse.
Surgido há mais de 5 000
anos na região onde hoje está a Índia, o ayurvedismo acredita que saúde nada
mais é do que o resultado do equilíbrio do homem com a natureza – e consigo
mesmo. Naquela época primeva – as pirâmides do Egito estavam sendo construídas!
–, o conhecimento médico era passado oralmente de mestre para discípulo. O
termo ayurvedismo data daquele tempo e tem origem no sânscrito – significa
“conhecimento da vida”.
Para o ayurvedismo, tudo o
que existe na Terra – inclusive nós – é composto por cinco elementos: espaço,
ar, fogo, terra e água. O espaço, que os ayurvedas chamam de éter, representa a
ligação entre os homens e a divindade. O ar é movimento, o fogo é calor, a água
adere e a terra dá consistência. Da combinação desses cinco elementos, segundo
a doutrina, constroem-se os três tipos básicos de constituição física e
psicológica dos seres humanos (ou dosha, em sânscrito): ar e espaço formam
Vata, fogo e água formam Pitta, água e terra são Kapha.
Pitta é o dosha do fogo, o
elemento da transformação. Portanto, as pessoas de Pitta seriam empreendedoras
e objetivas.
Vata é a constituição do ar
e do espaço. As pessoas de Vata seriam criativas e alegres, porque o ar está
sempre em movimento.
Kapha é o dosha da água e da
terra. As pessoas sob sua égide seriam amorosas, equilibradas e estáveis.
Uma consulta com um médico
ayurveda pode durar horas. E a primeira coisa que ele fará é descobrir qual é o
seu dosha. (Diz-se que alguns médicos indianos podem identificar o dosha à
primeira visão do paciente.) Após perguntar detalhes como seu tamanho ao nascer
e como anda o seu apetite sexual, tudo é examinado: o ritmo da pulsação, o
aspecto da língua dos olhos e dos lábios, a temperatura da mão, as linhas do
rosto. Detalhes mínimos são observados: desde o seu modo de falar e caminhar
até eventuais tiques nervosos. Para o ayurvedismo, seu corpo pode revelar mais
detalhes sobre a saúde do que jamais imaginou a filosofia halopata.
Um dos tratamentos mais
comuns em medicina ayurvédica é o Pancha Karma: uma desintoxicação feita à base
de massagens com óleos infundidos com ervas. Segundo Marcia de Lucca, eles
penetram no corpo eliminando toxinas, diminuindo o estresse, melhorando o
desempenho do sistema imunológico e ativando o sistema circulatório. “É muito
importante que a pessoa sinta que corpo, mente e espírito formam uma coisa só.”
A alimentação é um ponto
importante para o ayurvedismo. Cada dosha requer uma dieta especial.
Quem é Pitta, por exemplo, o
elemento do fogo, deve evitar comer pimenta e amendoim, alimentos energéticos e
“quentes”.
Quem é Vata, o elemento do
ar, deve evitar frutas secas e cereais, porque seu organismo já é, em geral,
pouco hidratado.
Isso tudo funciona? Aloízio
Oria, 63 anos, saiu há meio ano do consultório do seu médico com os exames
cardíacos embaixo do braço e uma sentença pairando sobre o pescoço: 70% da veia
terciária, um dos principais dutos sangüíneos do coração, estavam entupidos.
Ainda em tempo de reverter o quadro que poderia ser fatal, procurou o
tratamento ayurvédico. “Passei a meditar uma hora por dia, cinco vezes por
semana. Naquele momento, toda a energia do pensamento era dirigida para a cura
do meu coração”, diz. Em abril deste ano, Oria refez os exames. “A veia estava
totalmente desobstruída. Meus médicos e eu não acreditamos.”
Outra
história que faz pensar: a empresária paulistana Leila Pires, 39 anos,
descobriu cistos nos ovários e um mioma no útero. E achou que cedo ou tarde
teria câncer. “Além de outros casos na família, minha mãe teve câncer de mama.
Eu não pensava em outra coisa.” Para aliviar a tensão, Leila passou a
freqüentar sessões de massagem ayurvédica. A idéia de que a massagem pudesse
curá-la nem passava pela sua cabeça. Depois de seis meses de tratamento, em
exames de rotina, a grata surpresa: “Os exames apontaram útero e ovários
normais. Hoje acredito que a massagem trabalhou os pontos de energia certos.
Tenho certeza de que minha doença era de fundo emocional”.
O
ayurvedismo aposta na prevenção das doenças. “Se você acumula toxinas todos os
dias no seu corpo, gera um processo de enfraquecimento do organismo que abre
caminho para o desenvolvimento de doenças. Nosso trabalho é fazer com que você
não acumule toxinas e se purifique permanentemente”, diz Marcia de Lucca.
Como
se faz isso? Com práticas simples, mas que exigem boas doses de disciplina,
como reeducação alimentar, exercícios respiratórios, de meditação e posturais,
aliados às massagens. Esse é o escudo ayurvédico que teria o poder de
protegê-lo das moléstias. “A base da massagem é a coluna vertebral, que é a
sede das atividades neuromotoras. Você é tão jovem quanto a sua coluna
vertebral. Se você tem uma coluna alinhada seu corpo é saudável”, afirma a
carioca Ma Pren Ila, especialista em massagem ayurvédica.
O
ayurvedismo tem crescido em todo o mundo. Fundador do The Chopra Center for
Well Being (Centro Chopra para o Bem-Estar), na Califórnia, o endocrinologista
indiano Deepak Chopra é um dos grandes responsáveis pela tradução do
ayurvedismo para o Ocidente. Famoso por ter unido conhecimentos da antiga
sabedoria do Oriente com a experiência da moderna medicina ocidental, Chopra
administra, além do Centro, uma série de produtos que carregam sua marca: tem
21 livros publicados, editados em 30 idiomas, vídeos e fitas de áudio com
ensinamentos indianos, óleos, chás e temperos. Entre seus clientes estão
estrelas de Hollywood, como Demi Moore e Michael Douglas. Chopra tornou-se
milionário e hoje passa boa parte do tempo viajando, dando palestras por todo o
mundo (no mês passado esteve no Brasil).
Muitos
médicos brasileiros têm se especializado em ayurvedismo. Mas nem todos excluem
os exames tradicionais. “Apesar de ser ayurveda, o primeiro diagnóstico que
faço é baseado na visão ocidental”, diz o clínico-geral carioca Aderson Moreira
da Rocha, presidente da Associação Brasileira de Ayurveda. O cirurgião e
homeopata paulista César Deveza encarou a leitura em sânscrito das escrituras
originais para se tornar mestre em ayurveda. Ele diz que o segredo do
ayurvedismo é entender o ser humano como um ser uno e integrado. “Uma doença
não é apenas um órgão doente. Não adianta dar um remédio para o estômago de um
paciente que está com um conflito existencial, que teve uma úlcera em função da
angústia. A úlcera se resolve, mas o paciente continua doente.”
Deveza
está desenvolvendo um projeto de tratamento ayurvédico no Instituto do Coração,
o Incor, em São Paulo. “Muitos dos pacientes têm problemas cardíacos e
respiratórios somatizados. E muitos dos sintomas físicos estão relacionados com
o estado emocional e psicológico.” Segundo Deveza, há uma pressão antiayurveda
muito forte por parte da indústria farmacêutica. “Imagine quanto dinheiro vai
deixar de ser ganho se a medicina ayurvédica começar a se desenvolver com mais
força.” E completa: “Uma medicina que sobrevive por mais de 5 000 anos tem que
ter um bom fundo de verdade”.
Texto
extraído da revista SUPERINTERESSANTE – CADERNO BEM ESTAR